A Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica) avalia que a recomendação do Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) para cancelar a licença de instalação do Parque Eólico na Serra do Feiticeiro, em Lajes, na região Central do Estado, pode frear investimentos voltados à cadeia produtiva local de energia eólica. A licença, segundo aFederação das Indústrias do Rio Grande do Norte (Fiern), passou oito anos em análise. Na avaliação da presidente da Abeeólica, Elbia Gannoum, a ‘interferência’ pode representar um cenário de insegurança jurídica para as empresas, além de influenciar na migração de recursos para outras regiões do Nordeste.
Conforme aponta a presidente da Abeeólica, há uma necessidade global de descarbonização da matriz energética e medidas como a do MPRN podem prejudicar esse processo. “Esse tipo de interferência traz uma insegurança muito grande para quem está fazendo investimentos, porque um parque eólico exige uma grande quantidade de capital porque tem muito investimento. Se a todo momento os licenciamentos ficarem sujeitos a dúvidas e questionamentos por órgãos do Ministério Público, que tem o seu papel fundamental, isso vai prejudicar os nossos investimentos em energia eólica”, argumenta.
Aliado a isso, uma vez que a energia eólica está altamente presente na região Nordeste, muitas empresas podem iniciar a migração de investimentos do Rio Grande do Norte para outros estados. Ela lembra, ainda, que o licenciamento dos parques eólicos está baseado em uma resolução federal do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), publicada em 2014, seguida rigorosamente pelos órgãos ambientais para realizar a licença de empreendimentos.
Isso significa que não há impedimentos do ponto de vista legal e regulatório para a instalação do Parque Eólico de Lajes, uma vez que a licença foi pautada pela legislação. “O Brasil é um país muito sério em relação à legislação ambiental. É um país que respeita o meio ambiente e tem todo seu arranjo ambiental muito bem estruturado em leis e regras. É claro que elas precisam ser atualizadas, e elas são. É um país que tem confiança do investidor, mas na medida que essas inseguranças jurídicas vão aparecendo ele vai perdendo a credibilidade”, adverte.
A recomendação do Ministério Público do Estado foi divulgada na última quinta-feira (23) e foi direcionada ao Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema). De acordo com o documento, a emissão da LI pelo Idema ocorreu mesmo após negativa do Núcleo de licenciamento de Parques Eólicos (NUPE/Idema) e da importância da Serra do Feiticeiro na conservação da Caatinga. O Parque de Lajes, segundo o MPRN, está parcialmente inserido na região.
Elbia Gannoum, por sua vez, esclarece que as negativas são parte do trâmite para emissão de licenças e têm por objetivo requisitar a realização de mais estudos ambientais. O Parque Eólico do município, por exemplo, teve um longo processo de licenciamento, por meio de discussão técnica e estudos preliminares que eliminaram eventuais riscos que poderiam ocorrer. “Um parque como esse que teve um processo longo, com muita discussão e que no final teve uma licença, é sinal que realmente ela poderia ter sido emitida”, complementa.
Em nota, o Idema/RN informou que vai analisar os critérios técnicos indicados pelo MPRN “para posterior posicionamento, pois a mesma se trata de um projeto amplamente discutido tecnicamente pelo órgão ambiental”. A reportagem da TRIBUNA DO NORTE questionou o órgão sobre a previsão em que o posicionamento será divulgado e os fatores que levaram a emissão da LI, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.
Após 8 anos de análise, recomendação preocupa, diz Fiern
O presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte (Fiern), Roberto Serquiz, afirma que recebe com estranheza a recomendação do MPRN para que o Idema cancele imediatamente a licença concedida para a instalação de um parque eólico na Serra do Feiticeiro, em Lajes, região Central do RN e afirma que esse fato abre uma preocupação quanto à segurança jurídica.
“A informação é de que tal licença tramitou entre 2014 e 2022 no órgão ambiental, portanto levou 8 anos em estudos, debates, análises e ajustes para ser emitida. Atualmente, a empresa já dispõe de Licença de Instalação, o que indica que todas as etapas anteriores já foram superadas, com a efetivação de grandes investimentos. A recomendação, a essa altura, enseja a nossa preocupação com a segurança jurídica, tão importante na configuração de um ambiente de negócios saudável para o desenvolvimento do Estado e princípio fundamental para a consolidação do empreendedorismo e a atração de investimentos ao nosso Estado”, afirma Serquiz.
A Fiern, segundo ele, se posiciona a favor da segurança jurídica, “para que as empresas e os investimentos aqui realizados possam ter confiança nas licenças concedidas e na legislação vigente.”
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE procurou a Associação Potiguar de Energias Renováveis (Aper-RN) e a Prefeitura de Lajes para uma posição sobre o assunto, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição, no sábado (25).
Na avaliação de Elbia Gannoum, o Brasil apresenta uma vantagem favorável frente ao cenário global no processo de transição energética, o que influencia diretamente no desenvolvimento socioeconômico do País. Na região Nordeste, especialmente, ela aponta que a chegada dos parques eólicos trouxe um crescimento significativo, gerando um aumento de 20% no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Isso porque, ao promover a descarbonização, o País também fomenta o campo social.
Ela reitera, contudo, que não é possível levar investimentos para locais marcados pela insegurança jurídica e regulatória. “Esse tipo de insegurança coloca em xeque, inclusive, a própria lei do País e suas resoluções, se começa a pensar que o País não é sério, pois tem legislação e ela não é seguida, ou sofre interferência”, complementa. Embora reconheça a importância do papel exercido pelo Ministério Público, ela afirma que as empresas também precisam ser respeitadas.
Em Lajes, onde o parque eólico já teve processo de instalação iniciada, a presidente da Abeeólica afirma que a possível suspensão da LI pode levar a empresa responsável pelo projeto a desistir de investir no Rio Grande do Norte. Posteriormente, diz ela, o Estado poderá enfrentar um panorama de desistência e migrações de investimentos para outras regiões.
A tendência de insegurança jurídica pode impactar negativamente o Brasil, dado que os investimentos em energia renovável têm sido a chave para o desenvolvimento socioeconômico. “Não é apenas uma região específica, mas o País como um todo vai perder uma grande oportunidade, que é estimular investimentos para trazer energia limpa e renovável para a economia global e se colocar como um player importante. Isso é importante porque o Brasil é um país em desenvolvimento e muito carente em crescimento econômico e desenvolvimento social”, complementa Elbia Gannoum.
Tribuna do Norte
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