Segurar o filho em um abraço, sentir o cheiro e criar memórias afetivas com mais um membro na família é um dos momentos mais esperados pelos pais desde que o teste de gravidez dá positivo. Esse sonho, no entanto, para algumas mães pode encontrar no caminho uma angústia: a prematuridade. Dados do Ministério da Saúde mostram que dos 15.038 nascidos no RN, até 30 de novembro de 2023, 4.468 foram classificados como prematuros.
É considerado prematuro o bebê que nasce com menos de 37 semanas. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), existem quatro classificações na prematuridade: entre a 34ª e 36ª semana e seis dias é tardio; de 23 a 33 semanas e seis dias tem classificação moderada; entre 28 e 31 semanas e seis dias é muito prematuro; e os casos mais graves são os nascimentos acontecidos abaixo de 28 semanas, sendo classificado como prematuro extremo. Quanto menos semanas, maior é a luta pela sobrevivência.
Esse é o caso de Levi, que nasceu com 28 semanas. Rosana Batista, mãe de primeira viagem aos 24 anos, não esperava que seu primogênito chegasse tão cedo ao mundo. Desde agosto, ela fica entre o Espaço de Mães Acompanhantes e o leito da Unidade de Terapia Intensiva (UTI), na Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC/UFRN/Ebserh), com a esperança da chegada pelo dia de alta do filho. No dia 28 de novembro, Levi completou três meses de vida.
“Foi do dia para a noite. Eu tive eclâmpsia e precisei interromper a gravidez. Foi um choque muito grande para mim e minha família, para todo mundo. Eu nunca esperei que fosse passar por isso”, desabafa Rosana, que está a cerca de 117 km de distância de casa. Ela deixou a cidade de Santa Cruz, na região agreste do Rio Grande do Norte, para ser atendida em Natal na MEJC. O pai também realiza visitas constantes a Levi.
A Secretaria do Estado de Saúde Pública (SESAP) aponta que existem cinco maternidades na rede materno-infantil de alto risco pelo Sistema Único de Saúde (SUS): a MEJC e o Hospital Estadual Dr. José Pedro Bezerra (Santa Catarina) em Natal, o Hospital Universitário Ana Bezerra (HUAB/UFRN/Ebserh) em Santa Cruz, o Hospital Divino Amor em Parnamirim, e o Hospital Almeida Castro, em Mossoró.
A Januário Cicco é uma das unidades de atendimento no Rio Grande do Norte de maior referência no tratamento e acolhimento a bebês prematuros. São 20 leitos de Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), três leitos de Unidade de Cuidados Intermediários Convencional (UCINCo), 15 leitos de Unidade de Cuidados Intermediários Canguru (UCINCa) e alojamento conjunto.
Dados cedidos pelo MEJC mostram que até setembro de 2023 foram realizados 2.815 partos, sendo 850 classificados como prematuros. Comparado ao mesmo período, em 2022 foram 840. A médica neonatologista da Maternidade, Anna Christina Granjeiro, explica que existem dois tipos de casos atendidos: as mães que sabem ainda no andamento da gestação que o parto pode acontecer em período prematuro, e o pré-natal é realizado na unidade, e aquelas que são encaminhadas por outras redes de atendimento por intercorrências.
Os principais fatores de riscos que podem gerar um parto prematuro são descobertos durante a gravidez. “Uma mãe com hipertensão ou diabetes gestacional, em tratamento de alguma infecção ou outras condições de saúde, já sabe que o bebê pode nascer prematuro”, informa a neonatologista.
A mãe dos gêmeos Josué e Samuel recebeu a notícia dessa possibilidade durante um ultrassom. Aos 29 anos, Josielma já tem experiência com a maternidade, ela é mãe de outro menino. No entanto, essa última gestação não foi da mesma forma. A angústia assumiu o lugar após os bebês nascerem com apenas 33 semanas.
“Um deles não estava se desenvolvendo, então foi preciso fazer a cirurgia. (Quando recebi a notícia), foi um susto”, relata Josielma, que também está distante de casa. Saindo de Touros com apoio da mãe e da irmã, ela precisou se deslocar cerca de 85 km para ser atendida na MEJC. Faz 10 dias que Josielma, Josué e Samuel são acolhidos pelos profissionais de saúde da Maternidade.
Nascer antes da 37 semanas significa enfrentar uma verdadeira luta. A médica Anna Christina Granjeiro aponta que “as complicações da prematuridade são as principais causas de morte em bebês abaixo dos cinco anos de idade”. Na esperança de sobrevivência, algumas sequelas podem perdurar durante a vida. Deficiência auditiva, deficiência visual, sequelas pulmonares, alterações no desenvolvimento e comportamento são alguns exemplos citados pela neonatologista.
Dados cedidos pela Secretaria Municipal de Saúde de Natal (SMS) apontam que em 2023 o maior quantitativo de bebês prematuros nascidos na capital são provenientes da Zona Norte da capital com 62,2%, seguido da Zona Sul (20,3%), Leste (10,0%) e Oeste (7,5%).
Na Maternidade Escola Januário Cicco, os bebês e as famílias são acompanhados por uma equipe multiprofissional, integrada por médicos neonatologistas, neurologia, oftalmologia, cirurgia pediátrica, cardiologia, ultrassonografista e profissionais de outras áreas como: enfermagem, nutrição, fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, psicologia, assistente social e farmácia.
O HUAB, em Santa Cruz, mantém o mesmo padrão da Januário Cicco. A importância dessa instalação no interior do RN reflete nos números. Nos últimos três anos nasceram 450 bebês prematuros na unidade, em que as famílias puderam usufruir do mesmo tratamento que é disponibilizado na capital. São cinco leitos de UTIN, cinco leitos de UCINCo e dois leitos de UCINCa.
Cuidados
A prevenção é essencial para evitar o acontecimento da prematuridade. A médica neonatologista da Maternidade, Anna Christina Granjeiro, orienta que os exames relacionados às intercorrências clínicas e infecciosas sejam realizados antecipadamente, para que seja possível detectar e tratar precocemente.
Januário Cicco recebe comitiva de franceses
Em celebração ao final do Novembro Roxo, mês de atenção à prematuridade, a Maternidade Escola Januário Cicco recebeu uma comitiva de médicos franceses do Assitance Hôpitaux Publique de Paris e Port Royal, unidades que integram a rede de hospitais universitários da França e tem especialidade nos prematuros extremos.
A visita aconteceu entre os dias 30 de novembro e 1º de dezembro, com o objetivo de realizar uma troca de experiências sobre as melhores práticas assistenciais desenvolvidas. Bruna Parrella, médica pediatra neonatologista, nasceu no Brasil, hoje atua na França e relata que o maior aprendizado proporcionado pelo MEJC é relativo à humanização do tratamento.
“A amamentação dá muito certo aqui (na Januário Cicco). A gente sabe que o leite materno é ouro, mas sobretudo para esses bebês que não terminaram de completar o desenvolvimento do cérebro”, relata a médica. Bruna aponta que na França ainda existe uma resistência, estimando que apenas dois terços das crianças são beneficiadas com leite materno.
Como contribuição à MEJC, a comitiva chega com conhecimentos relacionados “a gestos, técnicas e peculiaridades”, com foco nos bebês nascidos com menos de 28 semanas.
Uma das ações de humanização no tratamento dos prematuros no MEJC é a implantação do Método Canguru. Esse é um modelo de atenção integral voltado para a psiconeuroproteção do desenvolvimento do recém-nascido, através da utilização de protocolos para o controle da dor e manuseio, controle de ruídos e da luminosidade nas UTIN e contato pele a pele precoce entre o recém-nascido e seus pais.
Entre os benefícios do Método, o Ministério da Saúde identifica menor tempo de internação, estabilidade térmica, estimulação sensorial e oxigenação adequada.
Levantamento feito pela Associação Brasileira de Pais de Bebês Prematuros , com base nos dados do DataSUS, evidencia que de 2017 a 2021 o Acre aparece com a maior taxa do país – 14,02%. Em seguida, aparecem Roraima (13,98%); Amapá (13,82%); RN (12,79%) e RS (12,04%).
Tribuna do Norte
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