De 2021 a 2023 o Rio Grande do Norte registrou 386 assassinatos de
crianças e adolescentes com idades entre zero e 19 anos, conforme recorte
adotado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e o Unicef, autores
do levantamento. O número indica uma queda de 17% no período (141 mortes em
2021 e 116 no ano passado). Já os óbitos de crianças e adolescentes com idades
entre 10 e 19 anos decorrentes de ação policial caíram entre 2021 (com 33
registros) e 2022 (com 17), mas voltaram a crescer em 2023 (21 mortes). Os
casos de estupro dispararam no período e subiram 132,7% (na faixa de zero a 19
anos).
Conforme os
dados, em 2021 foram 422 registros de estupros de crianças e adolescentes,
contra 694 em 2022 e 982 em 2023. No acumulado dos três anos, foram 2.098
casos. Segundo o psicólogo Gilliard Laurentino, quando se trata da chamada
violência letal (aquela que resulta em morte) as maiores vítimas são a
população negra, residente em periferias. Já os casos de violência sexual
costumam afetar com bastante frequência crianças e adolescentes de todos os
estratos sociais, embora aqueles em situação de vulnerabilidade social estejam
bem mais expostos.
Para mudar o cenário, um primeiro
passo, de acordo com Laurentino, é a prevenção. Mas é preciso também uma rede apoio
fortalecida para atendimento às vítimas e familiares. “A urgência maior é que
todos os municípios se adequem à legislação de 2017, a Lei 3.431, conhecida
como Lei da Escuta Protegida. Ela traz dois aspectos. O primeiro estabelece a
função da Segurança Pública, do Ministério Público e do Judiciário na
responsabilização de crimes contra crianças e adolescentes”, afirma o
psicólogo.
“Já
o segundo aspecto aponta o papel dos garantidores dos demais direitos (saúde,
educação, assistência social e conselho tutelar), para permitir uma proteção
integral”, acrescenta Laurentino, assessor técnico do Cedeca Casa Renascer, em
Natal. O Cedeca é uma instituição sem fins lucrativos, que atua na defesa de
crianças e adolescentes no RN. “A lei é de 2017 e até 2019 os municípios
deveriam ter se adequado ao dispositivo. A ideia é que a criança e o
adolescente vítima ou testemunha de qualquer violência possa passar por uma
rede de cuidados”, diz.
Gilliard
Laurentino comenta, no entanto, que ainda falta prevenção, ao passo em que não
existe uma rede de apoio consolidada para atender à população afetada. “A
partir do artigo 70A e 70B do ECA, a gente tem uma série de prevenções que
deveriam ser feitas em todas as entidades públicas, principalmente nas escolas.
Pecamos neste aspecto e quando recebemos os casos não conseguimos dar uma
resposta por conta da estrutura insuficiente para avançar”, pontua.
A
TRIBUNA DO NORTE procurou a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesed),
a Delegacia Especializada na Proteção da Criança e do Adolescente (DPCA) e a
Secretaria de Trabalho e Assistência Social (Semtas) de Natal para saber quais
medidas têm sido adotadas para garantir melhor proteção a essa parcela. A
Semtas informou que mantém Unidades de Acolhimento para Crianças e Adolescentes
e também Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos que compõem a
rede de apoio na capital.
À
Sesed, a reportagem questionou sobre o aumento das mortes derivadas de ação
policial. A pasta, no entanto, não deu retorno até o fechamento desta edição. A
DPCA também não retornou aos pedidos para comentar os dados e explicar quais
ações têm sido implementadas para a redução dos números. O relatório produzido
pelo Unicef e FBSP traz apontamentos que devem ser priorizados no País para
prevenção da violência letal e sexual. Dentre eles, não banalizar os crimes
contra crianças e adolescentes, estabelecer o controle do uso da força pela
polícia, bem como do uso de armamento bélico, enfrentar o racismo estrutural e
a violência doméstica, além de capacitar profissionais que trabalham com essa
população e ampliar o acesso a serviços de proteção.
TRIBUNA DO NORTE
Nenhum comentário:
Postar um comentário