Delfim Netto, um dos economistas
mais poderosos do País e também uma das figuras mais complexas da história
brasileira, morreu na madrugada desta segunda-feira, 12, em São Paulo, aos 96
anos.
O
ex-ministro da Fazenda e ex-deputado federal estava internado desde 5 de agosto
no Hospital Israelita Albert Einstein em decorrências de complicações no seu
quadro de saúde. Ele deixa filha e neto. Não haverá velório aberto e seu
enterro será restrito à família.
Delfim foi ministro do regime
militar nos governos dos generais Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici e
João Baptista Figueiredo e deputado federal, mas também um dos principais
conselheiros de presidentes petistas e de empresários.
Era
ele que estava sob o comando da economia, entre 1967 e 1973, anos mais
violentos da ditadura, quando o Produto Interno Bruto cresceu 85% e a renda per
capita dos brasileiros, 62%. Delfim personificou o milagre brasileiro: em
quatro anos, saiu 18 vezes na capa da revista Veja e era a figura do governo
mais presente nas páginas dos jornais. Nenhum outro ministro concentrou tanto
poder como ele.
Delfim
não só testemunhou, como influenciou alguns dos momentos mais marcantes da
história do Brasil. Estava presente (e votou a favor), no dia 13 de dezembro de
1968, quando o general Costa e Silva baixou o Ato Institucional número 5,
decreto que acabou com liberdades políticas e deu poder de exceção a
governantes para punir arbitrariamente os inimigos do regime. Foi protagonista
do milagre econômico, que culminou mais tarde na crise do endividamento externo
brasileiro. Viu a hiperinflação, a redemocratização, participou da
Constituinte, criticou o Plano Real, ajudou o PT a chegar ao poder.
Aos
90 e poucos anos de idade, Delfim continuava contribuindo com o debate
econômico e não parou de se atualizar: seguia estudando e produzindo artigos
acadêmicos, em sua quinquagenária máquina de escrever Olympia. Com mais de 100
quilos em 1,60 metro de altura, o Gordo, como era chamado, tinha dificuldade
para caminhar, mas não para debater economia.
“Delfim
conversava muito, cuidava dos argumentos para garantir a civilidade, mas sempre
encontrou formas sutis de entrever suas críticas”, diz o economista Marcos
Lisboa. “Suas histórias eram permeadas de observações que despertavam a graça e
a simpatia dos ouvintes, em meio a críticas que despontavam ocasionalmente,
desde que o ouvido fosse apurado.”
O
ex-ministro não veio da elite. Neto de imigrantes italianos, nasceu e cresceu
no bairro do Cambuci, em São Paulo. Sua mãe, Maria, era costureira e ficou
viúva quando o filho tinha nove anos. O pai, José, trabalhava na empresa de
transportes da prefeitura de São Paulo (CMTC). Mas era o avô paterno – o
Antônio que lhe deu o nome – sua grande referência: o italiano que veio para o
Brasil nos anos 1880 para trabalhar na lavoura de café acabou fazendo a vida na
capital, calçando ruas a serviço da prefeitura. De calceteiro virou dono de uma
mina de pedras e passou a ser fornecedor do poder público – história que Delfim
adorava contar.
Estadão
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