O presidente Jair
Bolsonaro anunciou na noite desta quarta-feira (6), no Twitter o fim da
bandeira escassez hídrica, em vigor desde setembro do ano passado, e adoção da
bandeira verde na conta de luz a partir de 16 de abril - uma antecipação,
portanto, em relação ao prazo esperado para troca da bandeira, que seria o
final do mês. Nas contas do presidente, a conta de luz terá redução de cerca de
20% com a medida.
Bolsonaro não citou em sua postagem, contudo, se a medida foi
acordada com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), órgão responsável
pela decisão e que se reuniria no final do mês. Procurado, o Ministério de
Minas e Energia tampouco se pronunciou sobre a postagem do presidente.
"Bandeira verde para todos os consumidores de energia a
partir de 16/04. A conta de luz terá redução de cerca de 20%", publicou
Bolsonaro na rede social. "Com o esforço de todos os órgãos do setor
elétrico, conseguimos superar mais esse desafio e o risco de falta de energia
foi totalmente afastado. Os reservatórios estão muito mais cheios do que no ano
passado. Os usos múltiplos da água foram preservados", completou.
De acordo com Bolsonaro, não será mais necessário o
acionamento de geração termelétrica adicional no sistema elétrico nacional, o
que aumenta o custo da energia e é repassado para o consumidor, com impactos na
inflação. "Com a redução da geração termelétrica mais cara e o aumento da
produção das hidrelétricas e das demais fontes renováveis, os custos serão
menores durante o próximo período seco, que vai de maio a novembro, o que se
traduzirá em menores tarifas para os consumidores", acrescentou o
presidente no Twitter.
Especialistas ouvidos pelo Estadão alertam, no entanto, que a
queda vai ser diluída com os reajustes tarifários das distribuidoras, que serão
estabelecidos ao longo deste ano. A PSR,
maior consultoria de energia elétrica do País, estima que, em média, esses
reajustes serão de 15%. Então, computados os aumentos tarifários em 2022, a
redução média na conta de luz do consumidor residencial deve ser de 6,5%.
Anunciada em agosto, a bandeira escassez hídrica foi uma das
medidas estabelecidas pelo governo em 2021 para evitar falhas no fornecimento
de energia em meio a grave crise hídrica. O patamar, que se encerra em 30 de
abril, representa uma cobrança adicional de R$ 14,20 a cada 100 quilowatts-hora
(kWh). Em um cenário muito diferente, já que choveu o suficiente para garantir
a recuperação dos reservatórios, o governo descarta a possibilidade de
prorrogar a cobrança adicional ou a criação de um patamar extraordinário.
Com a queda da tarifa extra, a Aneel voltará a adotar os
moldes tradicionais do sistema de bandeiras, criado em 2015. Além de
possibilitar ao consumidor saber o custo real da geração e adaptar o consumo,
as bandeiras atenuam os efeitos no orçamento das distribuidoras, que não
precisam “carregar” os custos até o reajuste anual quando é necessário comprar
uma energia mais cara. Na prática, as cores verde, amarela ou vermelha indicam
se haverá ou não cobrança extra nas contas de luz e o valor. O patamar para
maio será divulgado no dia 29 de abril.
Para o gerente de Preços e Estudos de Mercado da consultoria
Thymos Energia, Gustavo Carvalho, a cobrança mais cara já poderia ter sido
suspensa há alguns meses, dado o cenário positivo em relação às chuvas. Nos
últimos meses, o governo tem limitado a quantidade e o valor das usinas
térmicas em operação. “O propósito das bandeiras tarifárias é sinalizar o custo
do despacho térmico. Como o custo agora é menor, não faz sentido manter uma
bandeira”, afirma. Ele estima que em julho, agosto e setembro deve ser acionada
bandeira amarela.
Desaceleração da inflação
Além dos efeitos positivos para os consumidores, o fim da
bandeira extraordinária deve levar a uma desaceleração da inflação em maio. Em
2021, a economia foi fortemente impactada pelos sucessivos aumentos na conta de
luz. A criação do patamar extraordinário e outras medidas com custos
bilionários adotadas pelo governo foram responsáveis por pressionar os preços
da energia, que fecharam 2021 com alta de 21,21%. O cenário foi citado pelo
presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em carta enviada ao ministro
da Economia, Paulo Guedes, para explicar os motivos que levaram a inflação a
ficar fora da meta estabelecida.
O economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação
Getúlio Vargas (Ibre-FGV) André Braz afirma que, caso a agência decida, de
fato, acionar bandeira verde, o impacto será absorvido já em maio. "A mudança na bandeira vai trazer uma
redução destacada no preço da energia elétrica e um efeito grande na inflação
média, que pode até ser negativa. A previsão é de um IPCA médio de -0,20% em
maio", explica. "É um efeito nacional, todas as cidades vão registrar
o movimento ao mesmo tempo, diferente dos reajustes das distribuidoras, que
acontecem em datas diferentes."
Na mesma linha, o economista-chefe da Austin Rating, Alex
Agostini, afirma que qualquer redução na energia tem impactos positivos na
inflação, mas que isso é um movimento pontual. "Vai ser uma notícia boa,
pois energia elétrica é um dos itens que mais pesa na inflação. É um alívio,
mas não suficiente para tirar a inflação da trajetória de alta que vem sendo
observada nos últimos meses." Agostini destaca que outros componentes
podem fazer com que os preços desacelerem em maio, como o valor do dólar e uma
possível redução no preço do petróleo.
Tribuna do Norte