JUDICIÁRIO
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quinta-feira (1º), por maioria, validar a possibilidade da chamada “revisão da vida toda”, tese que poderá ser usada para o recálculo de aposentadorias.
A Corte decidiu que contribuições previdenciárias anteriores ao Plano Real, instituído em 1994, podem ser usadas para recalcular valores de aposentadorias. Com isso, o benefício de alguns brasileiros aumentará.
O placar foi 6 a 5. A corrente vencedora foi a do relator, ministro Marco Aurélio (aposentado). Acompanharam o entendimento os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber.
Votaram contra a possibilidade de revisão da vida toda os ministros Nunes Marques, Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
Ainda não há um cálculo de quanto a mudança pode custar. O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) fez uma estimativa de que a União teria prejuízo de R$ 46 bilhões se metade dos aposentados nos últimos 10 anos solicitasse a revisão.
A revisão das aposentadorias deverá ser feita caso a caso. Ou seja, será preciso entrar com ações na Justiça para requerer a revisão, desde que o cálculo seja mais o favorável.
Há restrições temporais para quem pode requisitar o recálculo. Só pode pleitear a revisão quem passou a receber aposentadoria a menos de 10 anos e até novembro de 2019 (com as novas regras da Reforma da Previdência).
No julgamento, a maioria dos ministros entendeu ser possível aplicar a regra mais vantajosa para a definição das aposentadorias de trabalhadores que ingressaram no RGPS (Regime Geral de Previdência Social) antes da Lei 9.876/1999. A norma alterou a forma de contagem dos salários de contribuição para o cálculo do benefício.
A lei estabeleceu uma regra de transição para os trabalhadores, que excluiu contribuições anteriores a julho de 1994. A intenção era garantir uma situação benéfica a quem se aposentasse, evitando efeitos da inflação sobre os salários recebidos antes do Plano Real.
A norma de transição, no entanto, acabou sendo menos atrativa a parte dos trabalhadores. Em alguns casos, os valores das aposentadorias seriam maiores se calculados pela regra definitiva.
A decisão tem repercussão geral, ou seja, deve ser aplicada por todos os tribunais do país em casos semelhantes. A tese fixada foi a seguinte:
“O segurado que implementou as condições para o beneficio previdenciário após a vigência da lei 9876 de 26/11/1999 e antes da vigências das novas regras constitucionais introduzidas pela emenda constitucional 103 de 2019 têm o direito de optar pela regra definitiva, caso esta lhe seja mais favorável”.
“REVISÃO DA VIDA TODA”
A discussão sobre a chamada “revisão da vida toda” vem de questionamentos de aposentados sobre a Lei 9.876 de 1999. O texto trouxe uma nova fórmula de cálculo da aposentadoria, determinando uma transição para quem já contribuía com a Previdência antes do Plano Real. O marco da transição seria julho de 1994.
No caso específico discutido pelo STF, um aposentado questionava o cálculo de sua aposentadoria, fixada pela regra de transição em R$ 1.493. A defesa do aposentado dizia que, caso fossem consideradas as contribuições feitas antes de julho de 1994, o valor da aposentadoria seria de R$ 1.823.
A tese determina que o cálculo da aposentadoria poderá considerar todas as contribuições feitas pelo trabalhador, inclusive aquelas anteriores ao Plano Real, caso essa opção seja mais benéfica ao aposentado.
QUEM SE BENEFICIA?
Apesar da nova tese, a mudança deve beneficiar um número pequeno de aposentados, segundo o advogado João Osvaldo Badari, que atuou como amicus curiae no processo junto ao IEPREV (Instituto de Estudos Previdenciários).
A regra não alcança o aposentado que recebeu seu 1º pagamento de benefício há mais de 10 anos, em razão da decadência decenal. Ou seja, quem já recebe aposentadoria há ao menos uma década por meio da base de cálculo da regra de transição não poderá pedir uma revisão.
O aposentado beneficiado pelas regras instituídas pela Reforma da Previdência de 2019 também não pode solicitar a revisão, uma vez que recebe os valores a partir de regras novas.
Segundo Badari, a revisão é voltada para quem contribuía com a previdência antes do Plano Real e passou pela regra de transição, cujo marco foi em julho de 1994. Os mais afetados seriam trabalhadores que recebiam salários maiores e que viram sua remuneração diminuir até o marco da implantação do Plano Real.
Quem começou a contribuir com a previdência após julho de 1994 não é afetado.
“Uma regra de transição jamais pode ser mais desfavorável que a regra permanente. Isso vai de acordo com decisões do próprio STF na aplicação do melhor benefício”, afirmou o advogado.
Não há um cálculo exato do quanto a mudança fixada pelo STF poderá custar aos cofres públicos. Em voto contra a revisão da vida toda, o ministro Nunes Marques citou gastos de R$ 46,4 bilhões até 2029, segundo dados informados pelo INSS.
O número, porém, é questionado por Badari. “O INSS coloca que os anos que mais teriam gastos seriam 2009, 2010 e 2011, mas há o prazo decadencial. A partir dos 10 anos em que o aposentado recebe o benefício, ele não pode pedir a revisão”, disse.
O advogado ressalta que a revisão deverá ser feita caso a caso mediante um cálculo prévio e alerta aposentados a tomarem cuidado com promessas de decisões a partir da decisão do Supremo. “A revisão não é generalizada, e sim de caso a caso”, declarou.
Conforme o advogado Bruno Minoru Okajima, sócio do escritório Autuori Burmann Sociedade de Advogados, a tese fixada pelo STF deverá ser observada por todos os juízes e tribunais nos casos em tramitação com essa mesma demanda.
“Para que o trabalhador aposentado possa ter a revisão do beneficio, ele vai ter que ajuizar uma ação”, declarou. “O número de ações que vão ser ajuizadas agora não vai ser tão grande por conta do prazo decadencial. O trabalhador tem até 10 anos para ajuizar ação pedindo a revisão do benefício, contados do mês seguinte ao da 1ª parcela da aposentadoria. Aqueles que não ajuizaram ação, vão ter que ajuizar ação específica pedindo a revisão do cálculo do benefício”.
O advogado Marcos Poliszezuk, sócio-fundador do Poliszezuk Advogados, afirmou que a decisão do Supremo beneficia os aposentados que foram prejudicados com a Lei 9.876/1999 que criou o fator previdenciário e mudou a forma de cálculo para a aposentadoria.
“Como se trata de entendimento jurisprudencial, o mesmo deverá ser revisto através de ações judiciais, uma vez que a legislação ainda continua em vigor e poderá ingressar com essas ações o segurado que possui inscrição no INSS em data anterior a 29/11/1999 (data de publicação da lei), que contribuíram antes deste período e que tenha requerido o benefício após a promulgação da lei”.
Poder 360