O setor da pesca no Rio Grande do Norte sofrerá uma perda
significativa neste mês. Por decisão do Governo Federal, através dos
ministérios da Pesca e Meio Ambiente, a pesca da principal espécie de atum será
suspensa a partir do sábado (16). A medida, que foi publicada nesta sexta-feira
(15) no Diário Oficial da União, ameaça pelo menos 2,5 mil empregos no estado e
pode gerar perdas de R$ 30 milhões para o setor.
A
pesca do atum, especialmente da espécie albacora-bandolim, segue regras
internacionais devido ao caráter migratório dos peixes, que buscam alimentos em
correntes marítimas e percorrem outros continentes através das águas do oceano
Atlântico. A Comissão Internacional para a Conservação do Atum Atlântico
(ICCAT, na sigla em inglês), composta por 55 países e 25 observadores,
estabelece normas para a pesca, definindo que pode fazer a captura, em que
período do ano, em que locais, com que métodos e na quantidade
pré-estabelecida.
Para
a espécie de atum albacora-bandolim, que tem aproximadamente 90% no Brasil de
sua pesca por embarcações da região Nordeste, ao ICCAT definiu o limite de
5.440 toneladas para todo o país no ano de 2023. A quantidade é rateada entre
as cinco modalidades de pesca (cardume associado, espinhel horizontal de
superfície, espinhel de Itaipava, linha/vara – com isca viva e cerco) e essa
foi o primeiro ano em que ocorreu essa divisão de cotas.
O
monitoramento é feito pelas próprias empresas de pesca, que repassam as
informações para alimentar o banco de dados e também para dar subsídios
científicos relacionados aos estudos sobre o comportamento de correntes e
espécies de peixes. Ao atingir 95% da cota, o Governo Federal determinou a
suspensão. Porém, o mês de dezembro é considerado o principal para o setor,
tanto na disponibilidade dos peixes quanto na demanda e preços praticados no
mercado internacional. Por isso, os empresários do setor criticaram a suspensão
neste momento e criticaram a decisão do Governo Federal porque, no entendimento
deles, poderia haver uma compensação da cota em 2024.
Presidente
do Sindicato da Indústria da Pesca no Rio Grande do Norte, Gabriel Calsavara
explicou que o ICCAT prevê a compensação por parte dos países em caso de se
extrapolar a cota. De acordo com ele, por ser o primeiro ano do monitoramento e
rateio, seria um momento de adaptação e o Governo Federal deveria ter repensado
a decisão.
“A
decisão do Ministério da Pesca e do Meio Ambiente impacta negativamente todo o
setor. No meu entender, mostra a falta de maturidade dos gestores públicos
brasileiros diante de um recurso que é admnistrado internacionalmente. O Brasil
já está cumprindo e se adequando aos novos controles de divisão de cotas. É
possível fazer a compensação no ano seguinte. Foi como fechar shoppings no
período de Natal e Ano Novo e liberar a abertura somente em fevereiro”,
comparou Gabriel Calsavara.
Na
projeção de exploração do atum da espécie albacora-bandolim, o Brasil
extrapolaria em aproximadamente 200 toneladas o limite de pesca, o que poderia
ser compensado no transcorrer de 2024 e garantir às empresas saúde financeira
para fechar 2023 e não perder um período de alto lucro no setor. Contudo, com a
suspensão, o prejuízo será inevitável.
Ao
todo, o Rio Grande do Norte tem 250 embarcações que estão proibidas de ir ao
mar. Pela determinação da portaria do Governo Federal, as embarcações de pesca
que estiverem em cruzeiro de pesca devem retornar a porto brasileiro e realizar
o último desembarque até 30 de dezembro. Com isso, os empregos de
aproximadamente 2,5 mil pescadores que atuam nessas embarcações estão
ameaçados. Além disso, o prejuízo estimado por cada embarcação parada varia
entre R$ 30 mil e R$ 50 mil e a perda de faturamento é de aproximadamente R$ 20
milhões.
Proprietário
da Martuna Pescados, o empresário Marcelo Martini disse que haverá problemas
para fechar as contas de fim de ano e que os próprios pescadores estão temerosos
com a situação. “São contas de fim de ano que precisam ser fechadas tanto pelos
empregadores quanto pelos empregados, prestadores de serviço. Dezembro,
historicamente, é o melhor mês da pesca do atum para os barcos brasileiros e
também o melhor preço entre os 12 meses do ano”, explicou Martini.
Para
Gabriel Calsavara, o impacto social da decisão será visível e imediato, assim
como também haverá o estímulo para profissionais que atuam à margem da lei.
“Serão 2,5 mil pessoas sem trabalhar em um período em que o setor vai atingir
os melhores preços e melhores mercados. Com isso, estimula a importação de
atuns e, pior do que isso, vão estimular a pesca clandestina, porque estarão
sozinhos e os preços estarão lá em cima. Prejudica um setor que vem gerando informações
para a ciência e riqueza para o país. Foi uma grande falta de experiência (do
Governo Federal) para tratar do assunto. É uma posição que eu espero que não se
repita mais”, lamentou Calsavara.
Acordo
Em
20 de novembro deste ano, o Brasil conseguiu autorização do ICCAT para manter o
limite de pesca do atum albacora bandolim em 6 mil toneladas sem ter que
“devolver” de uma vez só as 1.587 toneladas pescadas em excesso em 2022. O
Brasil estava fora dos tratados internacionais de sustentabilidade da pesca
desde 2019.
A
comissão levou em conta que o Brasil já está pagando em 2023 a captura
excedente de 553 t de atuns em 2021 e estabeleceu um Marco Regulatório Nacional
para superar a continuação da captura excessiva a partir de 2023, sob a
coordenação do MPA. “Notando a disposição do Brasil de reembolsar as capturas
excedentes acumuladas e cumprir os requisitos da ICCAT de gestão e conservação
do atum, a comissão recomenda que a sobrepesca de atum de 2022 será reembolsada
num período de 5 anos, de 2024 a 2028, da seguinte forma: 355 toneladas em 2024
e 308 toneladas de 2025 a 2028”, disse o documento aprovado durante a reunião
que ocorreu no Egito.
A
medida, apesar de positiva, foi considerada insuficiente por representantes do
setor de pesca no Brasil. O argumento era de que o Senegal, por exemplo,
conseguiu diluir a “dívida” em 10 anos, o dobro do prazo dado ao Brasil.