A energia renovável tem ganhado destaque no cenário global com a busca por soluções sustentáveis para o planeta. No Brasil, a energia eólica se destaca como uma das principais fontes de energia limpa, impulsionada por condições naturais favoráveis, além de um crescente investimento em infraestrutura. Líder absoluto de geração e capacidade instalada de energia eólica, o Rio Grande do Norte é o grande protagonista desse processo e o futuro é promissor, aponta a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Gannoum, que conversou com a TRIBUNA DO NORTE. Gannoum diz que o Rio Grande do Norte pode triplicar o mercado atual com a chegada das eólicas offshore. Ela também fala da expectativa pela regulamentação do setor e principais desafios para atrair investimentos.
O Rio Grande do Norte é líder de geração de energia eólica no Brasil. O que isso te diz em termos de perspectivas de desenvolvimento?
O Estado do Rio Grande do Norte é o líder hoje do Brasil em potência instalada e também em geração de energia e essa liderança é explicada em primeiro lugar pelo recurso. O recurso eólico do Estado é um dos melhores recursos do País, toda região Nordeste é uma muito boa em termos de ventos. Os melhores recursos do País estão aqui na região Nordeste e com muito destaque para o para o Rio Grande do Norte, Bahia, Ceará e o Piauí. Mas eu falo com frequência que o recurso sozinho não resolve. Você precisa buscar os meios para dar o sinal para o investimento, para atrair o investidor para o Estado, então é muito importante e isso é um investimento do Estado mesmo, não é do governo federal, que é buscar um ambiente de negócios para os investidores, que seja atrativo, que dê segurança para o investimento e dê segurança para Capital porque o capital é tão fluido quanto o vento. Ele vai para outros lugares. A gente tem que pegar esses recursos e trazer para o Estado e precisamos de aparatos legais e regulatórios que sejam críveis, para que os investidores cumpram, tem que ter estabilidade regulatória também.
Quais os principais desafios para atrair investimentos?
Um desafio muito importante dos Estados é ter uma legislação ambiental adequada, porque são eles os responsáveis por fazer o licenciamento ambiental dos projetos, cabe também ao Estado, e vem muito de um posicionamento do Governo do Estado, mostrar que os recursos estão aqui. O Governo do Estado Rio Grande do Norte recentemente lançou o seu Atlas de Energias Renováveis, que envolve energia eólica, solar de grande porte, solar geração distribuída, parques híbridos, eólicas offshore. E a primeira coisa que o Estado tem que fazer, é apresentar, é dizer: ‘Olha, senhores investidores, aqui temos bons recursos, bons ventos’. O Estado tem feito isso, se posicionado muito bem ao mostrar o potencial e também na questão regulatória, principalmente no que se refere ao meio ambiente. O papel do Idema é muito importante. Temos também os IPHANs estaduais que têm uma influência muito grande no processo de licenciamento e temos a própria posição do Governo do Estado ao atrair os investidores para fazerem investimento aqui. Esse é o pacote perfeito para atrair os investimentos e é isso que o Nordeste tem feito nos últimos 10, 15 anos.
O País tem 96 projetos de complexos eólicos offshore aguardando regulamentação. Como está a expectativa do setor por legislação?
Nós temos uma expectativa muito favorável no Congresso Nacional. Nos últimos dois anos, o Congresso tem trabalhado nas várias legislações que estão num pacote maior do País, no âmbito da transição energética, então nós estamos falando de regular mercado de carbono, de fazer lei para abrir os combustíveis para fazer um próprio projeto de transição energética, sobre hidrogênio verde e também as eólicas offshore, então nós estamos vendo, agora em fase final, a aprovação do projeto de eólicas offshore. Foi um trabalho que iniciamos lá atrás, ainda com o senador Jean Paul Prates, que foi o autor do projeto. Esse projeto foi aprovado no Senado, foi para a Câmara, em dezembro foi aprovado na Câmara e agora estamos no Senado em vias de aprovação, que deve acontecer nos próximos dias ou semanas. Com esta aprovação do projeto de lei de eólicas offshore, que traz como principal fator as diretrizes para a autorização de exploração do mar brasileiro, porque o mar é um bem da União e você não pode fazer nenhum empreendimento sem ter uma autorização por meio de lei, que vai permitir a realização de leilões de cessão de uso do mar.
Quando a lei existir e estiver em vigor. Quais serão os próximos passos até termos, de fato, os complexos funcionando?
Quem for o dono desta cessão, o detentor vai ter o direito de fazer efetivamente os estudos, principalmente ambientais, mas também estudos de viabilidade para fazer o seu primeiro projeto. Com a aprovação da lei neste momento, nós vamos partir para regulamentação via MME [Ministério de Minas e Energia] e organizar o primeiro leilão de cessão de uso do mar. Depois disso, vamos gastar aí mais uns três anos fazendo estudos para obter uma licença ambiental. Hoje tem cerca de 200 gigawatts [aguardando] no Ibama, mas isso não quer dizer nada por enquanto porque o Ibama não pode dar nenhuma autorização antes da aprovação da lei. Trabalhando nesse ritmo, nessa velocidade que está, no tempo certo, por volta de 2030 ou 2031, nós vamos ter nosso primeiro projeto de eólica offshore, rodando no mar. E se o Rio Grande do Norte é um Estado que tem um grande potencial de eólica onshore, isso é válido também para offshore porque o vento é o mesmo.
O RN pode ser otimista em ter o primeiro parque eólico offshore do País?
Há uma grande possibilidade de ser sim. O Rio Grande do Norte tem todos os atributos para atrair esse projeto.
Os investimentos tendem a aumentar nesse cenário da geração no mar?
Eu estava fechando o texto do boletim da Abeeólica, que trata o ano de 2023 e o Brasil bateu recorde de instalação de energia eólica. Nós instalamos 4,8 GW de eólica no País. O mundo bateu recorde, foram 116.6 GW de energia eólica instalada no mundo e o Brasil foi o terceiro país que mais investiu em energia eólica no ano passado. Em primeiro lugar a China e em segundo os Estados Unidos. Esses quatro ponto oito giga é o equivalente a R$ 35 bilhões. O Brasil investiu R$ 35 bilhões em energia eólica, sendo que grande parte desses projetos está no Rio Grande do Norte, que é campeão em geração, mas é campeão também em novos projetos, juntos com a Bahia. A nossa média anual de investimento é de R$ 35 bilhões. A chegada do hidrogênio verde e eu sei que o Estado tem um projeto grande de hidrogênio, o Atlas que foi feito também envolve o hidrogênio, vai aumentar ainda mais esses investimentos.
Que futuro a sra. projeta para o RN, quando o mercado das eólicas offshore estiver estabelecido?
A gente está agora para promover os investimentos em novas tecnologias, com destaque para eólica offshore e hidrogênio, então os investimentos que hoje já são de extrema relevância para o Estado, ele continua nessa posição, só que o montante vai ser muito maior porque as previsões que se tem, feitos por outras empresas, em 2040, o Brasil vai precisar de ‘mais um Brasil’ de capacidade instalada de energia para atender hidrogênio e esse ‘mais um Brasil’ vai vir de energia eólica e solar. O que está acontecendo hoje no Rio Grande do Norte tem o potencial de dobrar e triplicar nos próximos anos, agora nós precisamos nos preparar para isso. O recurso a gente tem, precisamos estar atentos à nossa regulação.
O hidrogênio verde é frequentemente mencionado como o futuro da energia limpa. Como essa produção funcionará?
O hidrogênio verde será feito com energia renovável, eólica e solar principalmente, e um investimento que a gente já tem hoje de R$ 35 bilhões, vai chegar um momento, ali por volta de 2027, 2028, que isso vai dobrar porque nós vamos precisar dobrar a nossa potência instalada para atender os projetos de hidrogênio. Esses R$ 35 bilhões têm um efeito multiplicador muito grande na economia brasileira. A cada R$ 1 que você investe em energia eólica, você devolve R$ 2,9 para economia brasileira em termos de PIB. O Brasil tem uma cadeia de produção nacional, a indústria eólica tem 80% da máquina dela fabricado no Brasil, então isso gera emprego e renda ao longo de toda a cadeia de produção, diferente da solar, que importa os painéis da China e dá emprego para chinês. Nós aqui damos empregos para brasileiros e esse efeito multiplicador será ainda maior com a produção de hidrogênio, que já está começando a acontecer. Ontem [13 de julho] nós tivemos a aprovação do projeto de lei numa comissão no Senado Federal, semana que vem ele deve ser aprovado no Senado e voltar para a Câmara muito em breve. A gente vai ter o projeto de lei de hidrogênio e o projeto de lei de eólica offshore aprovados no Congresso Nacional.
A Abeeólica propôs que os projetos de eólica offshore sejam executados com estaleiros e indústria nacional. Como funcionaria isso?
Na verdade, não é bem uma proposta, o modelo de eólica offshore já tem essa natureza porque os negócios de eólica offshore são enormes e a técnica offshore para gerar no mar é muito grande. Esses modelos nascem geralmente num conceito de porto-indústria, então quando você fizer um projeto, você vai construir a pá, a torre, ali mesmo no porto e você vai pegar um guindaste e levar essa torre lá para o mar, então naturalmente ele já vem nesse modelo de porto e de estaleiro.
No que se refere ao IDHM e PIB, os municípios que têm parques eólicos tiveram uma performance 20,19% e 21,15% melhor, respectivamente, para estes dois indicadores. Como a dinâmica das cidades são alteradas por esses fatores?
Uma coisa é a gente discutir energia renovável, que é uma energia competitiva também, que é mais barata e você ter uma energia renovável que não emite CO2, isso é fantástico para a humanidade, só que a energia eólica tem algo a mais. Além dela fazer tudo isso, ela tem uma característica econômica e social muito importante. A característica econômica está associada ao PIB, como eu disse, de R$ 1 para quase R$ 3. Nós fizemos dois estudos muito importantes e a chegada dos parques eólicos nas regiões trazem um efeito transformador muito grande em termos de crescimento e de desenvolvimento social. O nosso estudo mostrou que nas regiões em que os parques eólicos se instalaram, o PIB cresceu 21% e o IDHM cresceu 20%, nós fizemos uma análise comparada entre regiões que receberam partes eólicos e municípios que não receberam. Quando a gente está falando de desenvolvimento socioeconômico de PIB da região e de IDHM, a gente está falando dos efeitos na geração de emprego e de renda daquela comunidade, cidade, Estado.
Que efeitos práticos esse fenômeno tem na geração de emprego e renda? Há preocupação com a capacitação da mão de obra?
Nós instalamos 4,8 GW ano passado, isso dá em torno de 44 mil, 45 mil postos de trabalho, então é muito emprego que você gera ao longo de toda a cadeia de produção, só que o efeito não é só esse, só no emprego, que já é fantástico, porque ao gerar emprego você precisa treinar a mão de obra e nós investimos muito em treinamento, pelo ISI, na Bahia tem o Senai Cimatec, as universidades federais, a UFRN, o IFRN, então você traz essa questão geração de empregos. Só que a região passa a receber mais tributos e impostos, as prefeituras arrecadam o ISS que elas podem trazer melhorias para a cidades, um outro efeito muito forte é o efeito na renda das famílias por causa do arrendamento dos parques. Os parques eólicos não compram os terrenos, eles alugam arrendam das famílias e as famílias passam a receber uma renda por mês muito grande. Nós vimos muitas situações de famílias saindo do Bolsa Família que viviam lá com R$ 350 e agora tem um aerogerador no fundo do quintal e vai receber R$ 1 mil, R$ 2 mil, R$ 5 mil por mês, dependendo da quantidade. Isso transforma.
Tribuna do Norte