O Ministério Público Federal (MPF) enviou um documento de recomendação no qual cobra que a União e o Estado do Rio Grande do Norte localizem os presos que desapareceram após a rebelião ocorrida na Penitenciária de Alcaçuz, no ano de 2017, que foi considerada a mais violenta da história do estado.
A rebelião terminou, oficialmente, com 26 detentos mortos. Outros 27, no entanto, desapareceram dos registros do presídio - situação que segue até este ano de 2024, segundo o MPF. Outros presos fugiram no motim.
O documento de autoria do procurador da República Fernando Rocha recomenda que a União e o Estado adotem medidas preventivas e de reparação em relação ao caso. As autoridades têm o prazo de 10 dias para responder à recomendação.
Os documentos são endereçados ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania e à Secretaria da Administração Penitenciária do RN (Seap).
Em nota, a Seap disse, no que tange às competências legais da pasta, analisa as providências demandadas pelo Ministério Público Federal "com intuito de observar quais, entre elas, já foram atendidas e as eventuais pendências".
Dentre as ações de prevenção recomendadas contra rebeliões e possíveis novos desaparecimentos estão:
a criação de um plano de resposta imediata a rebeliões;
um sistema de registro eficaz de todas as movimentações dos detentos;
mobilização de equipes especializadas para varreduras e buscas;
uso de câmeras de segurança, drones e outras tecnologias de monitoramento;
e investigações coordenadas com a polícia e órgãos de direitos humanos.
Para auxiliar nas buscas, o MPF recomendou que o Poder Público mantenha contato contínuo e transparente com os familiares dos desaparecidos e:
utilize depoimentos de testemunhas, imagens de câmeras de segurança e informações da comunidade local para obter pistas;
trabalhe em conjunto com instituições como a Defensoria Pública, Ministério Público e órgãos de segurança;
promova testes de DNA caso sejam encontrados restos mortais ou evidências de crimes.
O MPF recomendou ainda uma política de reparação, caso não seja possível localizar os desaparecidos. Nesse caso, a União e o Estado do RN devem se responsabilizar por indenizar as famílias, “reconhecendo a omissão ou falhas no controle e proteção dos detentos sob sua custódia".
E também deve "emitir relatórios públicos detalhados sobre o andamento das investigações, os esforços de busca e as medidas adotadas”.
Massacre de Alcaçuz
O massacre de 2017 na Penitenciária Estadual de Alcaçuz foi o episódio mais sangrento do sistema prisional potiguar, terminando com 26 presos mortos. A rebelião começou no dia 14 de janeiro daquele ano e envolveu uma disputa de dois grupos criminosos rivais.
Os corpos de 26 presos foram encontrados em condições de extrema brutalidade. Com capacidade naquela época para 620 internos, Alcaçuz tinha 1.200 presos no dia da matança.
Antes de acontecer o massacre, os pavilhões 1, 2, 3 e 4 pertenciam à Alcaçuz. Já o pavilhão 5, antes dominado por presos do Primeiro Comando da Capital, fazia parte do Presídio Rogério Coutinho Madruga, que é um anexo de Alcaçuz. Na época, apenas uma cerca de arame farpado separava as duas unidades.
Armados, presos do PCC saíram do pavilhão 5 e invadiram o pavilhão 4, onde estavam parte dos presos do Sindicato do Crime do RN, facção rival que nasceu de membros desgarrados do próprio PCC.
Pacto de San José da Costa Rica
O procurador da República Fernando Rocha explicou que o Brasil é signatário do Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos) e da Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado.
Ele explicou que a Corte Interamericana de Direitos Humanos, inclusive, já condenou o país em outras ocasiões por casos semelhantes, envolvendo a falta de investigação adequada de presos desaparecidos.
“No caso da rebelião de Alcaçuz, a omissão na apuração e identificação de presos desaparecidos durante e após o conflito é uma violação dos direitos humanos desses indivíduos e de suas famílias, que seguem sem respostas adequadas do Estado sobre o paradeiro de seus entes queridos, agravando o sofrimento e perpetuando a impunidade“, disse.
Para o procurador, caso a omissão persista, o Brasil pode estar sujeito a novas sanções e condenações internacionais, tanto na esfera da Corte Interamericana, quanto em outros fóruns de direitos humanos.